SOBREPESO

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Às vezes preciso ficar sozinha para duvidar de mim. Ontem e hoje,  duvidei.

Assistia a um programa de televisão, quando o apresentador informou,  que um dos colegas de profissão havia falecido.  Então,  mostraram uma sequência de fotos e videos  do morto em vida. Ora sorrindo, ora compenetrado, exibia  cabelos  grisalhos, pele turva e amolecida, entre outras características. Ao final da homenagem,  congelaram o rosto dele na tela,  onde estava registrada a data de nascimento e morte. Engoli a seco, e ali fiquei, até que aquela sensação saísse de dentro de mim, pois constatei, que as nossas idades eram próximas. Indaguei-me: Por que ele,  e não eu?

Não que quisesse trocar de lugar com o desconhecido, mas porque na narrativa da reportagem,  parecia que era bom e natural morrer. Algo glorificante após os cinquenta.

Daí, estou refletindo sobre ter cinquenta anos ou mais…

Entre amigos, fazemos piadas desta sobrevivência,  literalmente do-lo-ri-da, mas se não fosse o nosso senso de humor, essa dor seria uma grande tristeza. Mas somos de uma geração que aprendeu a sacudir a poeira.

Por que me incomoda o sobrepeso  e outros danos da idade? Que peso é esse,  que me faz perder de vista o meu próprio calendário?

Juro em falso todos os dias,  que jamais comerei o  tanto comera na última refeição. Arrependendo-me,  por não ter usado protetor solar naquele dia de sol ardente. De não ter caminhado um dia a mais na semana. De não ter evitado um pedaço pudim. De não ter deixado na loja aquela caixa de chocolates ao leite. Um duelo diário entre as delícias e o meu corpo,  que julgo imperfeito e desafinado para os dias atuais.

As mídias nos enfeitiçam com físicos impecáveis, que ainda não sofreram com a maldição da gravidade, e  esquecemos que uma biografia  de monta,  como a nossa, deixa marcas permanentes, e infelizmente,  intransferíveis.

O que pesa mesmo, não é a idade ou o que está apontado na balança…

Somos passivos frente aos acúmulos. Queremos entrar nas roupas que não cabemos. Queremos sempre as mesmas coisas; a mesma família; os mesmos amigos; a mesma casa; a mesma silhueta… Mas a ansiedade desses desejos,  pesam muito mais,  do que  quatro fatias de uma pizza quatro queijos.

Por que tão relutantes? A família se incompleta aos poucos; alguns amigos não mais fazem falta; a casa tinha apenas paredes;  e definitivamente,  a  nossa robustez entrará em declínio,  até que sejam sugadas pelas raízes das plantas. Então…

Não faça promessas,

Nem chegue às pressas.

Não fertilize culpas,

Escorregue primeiro, depois peça desculpas.

Segure a  minha mão, mas não aperte,

Acorde, mas nem sempre desperte.

Resistentes e certeiras são as  serpentes!

Nós estamos à pururuca, como as cascas de sorvete.

Rejeite caronas e despreze palpites,

Finja que aceita.  Selecione os convites.

Se disserem que sim, hesite.

Se disserem que não, duvide!

Existe sobrepeso,  que não precisamos carregar.

ANA TEIXEIRA –  fevereiro, 2020


3 comentários sobre “SOBREPESO

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